Exclusivo: viatura com placa adulterada estava no local da morte de delator do PCC, horas antes do crime
08/12/2024
Fantástico teve acesso, com exclusividade, a imagens de câmeras de vigilância do Aeroporto De Guarulhos, que estão sendo usadas para esclarecer o assassinato de Vinícius Gritzbach. O Fantástico mostra o que um carro da polícia com placa adulterada fazia no aeroporto de Guarulhos no dia da execução do empresário
O Fantástico descobriu que, horas antes do assassinato do empresário Vinícius Gritzbach, no Aeroporto Internacional de Guarulhos, um carro suspeito estava no mesmo local onde tudo aconteceu. Era uma viatura descaracterizada, com a placa adulterada.
No dia do ataque, esse carro foi utilizado fora dos registros da polícia. Segundo pessoas envolvidas na investigação do caso, o agente da polícia civil Alfredo Alexander Raspa da Silva, que estava ao volante, alegou à Corregedoria que fez uso particular de um carro oficial - um bem público - para ir até o aeroporto. Ele afirma que adulterou a placa porque não queria ser descoberto.
Segundo Alfredo, ele estava de férias e foi ao aeroporto para pegar um voo para Porto Alegre, onde ficaria por dois dias.
Policial estava no local do crime
O Fantástico teve acesso, com exclusividade, a imagens de câmeras de vigilância do Aeroporto De Guarulhos, que estão sendo usadas para esclarecer o caso.
Às 15 horas, o carro passou pela área de desembarque do terminal 2 do Aeroporto Internacional de Guarulhos. Na placa, logo na primeira letra, há uma adulteração grosseira: uma fita adesiva é usada para formar a letra "a". Na verdade, a letra original é um "F" - que forma a numeração real da placa de uma viatura descaracterizada da Polícia Civil de São Paulo.
Depois de deixar o carro no estacionamento do terminal 2, Alfredo caminha, às 14h25. Esse é o local de execução de Vinícius. O voo dele partiria por volta de 15 horas, do terminal 1, que fica a três quilômetros de distância dali e onde também tem um estacionamento.
O policial disse que perdeu o voo e que, por isso, foi pra casa. O Fantástico apurou que ele ficou por horas no aeroporto e que, inclusive, foi visto no terminal 2 depois do assassinato, quando a área já estava cercada.
Cerca de 40 minutos depois do assassinato, Alfredo aparece, com um celular na mão esquerda, e caminha em direção ao local do crime. Então, começa a tirar uma série de fotos.
Imagens de câmera de segurança mostram Alfredo no Terminal 2
Reprodução/TV Globo
Apesar de circular em torno do local do crime, em nenhum momento ele fez contato com os policiais que trabalhavam no caso.
A corregedoria da Polícia Civil instaurou um inquérito pra investigar o que ele fazia no aeroporto, usando uma viatura oficial de forma clandestina e com a placa adulterada.
Alfredo disse ao Fantástico que confundiu o terminal, mas que tentou pegar o voo e que não conseguiu remarcar a passagem. Ele planejava desde setembro ir a Porto Alegre fazer um curso. Explicou que ficou no aeroporto até oito horas da noite, porque tentou comprar uma nova passagem, mas desistiu da viagem por causa do preço.
Sobre as fotos do crime, Alfredo falou que foi por interesse profissional, já que é policial. Ele reconheceu que errou ao usar o carro para fins particulares, e afirmou que não conhece Vinícius nem tem envolvimento com o crime.
Depois dessa conversa, ele mandou mensagem dizendo que não autorizava a divulgação dos áudios do telefonema.
Alfredo é policial do DEIC, o Departamento Estadual De Investigações Criminais. A viatura também é do DEIC. Trata-se do mesmo departamento onde trabalham policiais delatados por Vinícius Gritzbach.
Delator tinha medo de ser morto
Vinícius Gritzbach estava sendo investigado por lavar dinheiro para o PCC e, no fim do ano passado, começou a negociar um acordo de delação premiada com o Ministério Público de São Paulo. Ele deu nomes de integrantes da facção criminosa para quem fazia a lavagem e acusou policiais civis de corrupção.
Segundo ele, eram agentes do DEIC, do DHPP, o Departamento de Homicídios e Proteção À Pessoa, e também do vigésimo quarto distrito policial da capital paulista. Partes dessas denúncias de Vinícius contra policiais foram depois repetidas à Corregedoria Da Polícia Civil de São Paulo no fim de outubro.
A equipe do Fantástico apurou que o nome Alfredo Alexander Raspa da Silva não aparece na delação.
Alfredo Alexander Raspa da Silva
Reprodução/TV Globo
Vinícius era acusado ainda de ser mandante da morte de um dos chefes do PCC, com quem fazia negócios. Segundo a investigação, o motivo seria um desfalque de 300 milhões de reais que ele teria dado no bandido. Vinícius sempre negou o desvio do dinheiro e a participação no homicídio.
Em conversas com o Ministério Público, ele manifestou medo de ser alvo de um atentado.
“Eu precisava de um amparo de vocês também, porque senão você tá falando com um morto vivo aqui”.
A promotoria chegou a oferecer a inclusão de Vinícius no Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas, o Provita, que é federal, mas ele recusou. O empresário tinha escolta particular, formada em sua grande maioria por homens da Polícia Militar fazendo bico.
Vinícius Gritzbach foi atingido por 10 tiros e morreu no dia 8 de novembro quando voltava de uma viagem a Alagoas com a namorada.
Primeiras prisões
Na semana seguinte ao crime, a polícia apontou a participação de 2 pessoas:
Kauê Amaral Coelho, que estava no aeroporto e informaria à quadrilha da movimentação de Vinícius no desembarque;
e Matheus Augusto De Castro Mota - que teria feito um pagamento a Kauê de R$ 5 mil. Ele é dono deste carro que, segundo os investigadores, circulou pelo aeroporto no dia.
Atiradores fogem após execução de empresário em Guarulhos
Reprodução/TV Globo
Kauê e Matheus estão foragidos. A polícia conseguiu ainda imagens dos homens que atiraram em Vinícius. A identidade dos atiradores não foi revelada.
As primeiras prisões foram realizadas nesta sexta-feira (6). Depois de uma denúncia anônima, homens da rota prenderam Allan Pereira Soares e Marcos Henrique Soares Brito. Eles são tio e sobrinho.
Os PMs apontaram que num carro - que pertence a Allan, mas é usado por outros membros da família - havia um saco de munição, parte tinha o mesmo calibre das balas usadas no assassinato de Vinicius.
Na madrugada de sábado, Matheus Soares Brito, irmão de Marcos, foi preso por um outro grupamento da PM. Os irmãos e o tio moram no mesmo bairro de Kauê Amaral Coelho, o olheiro que está foragido.
Depois da audiência de custódia, o Ministério Público pediu a liberação de Allan e Marcos por falta de provas.
Matheus Soares Brito segue preso e teve os sigilos telefônico e telemático quebrados. Ele teria ajudado o olheiro Kauê a fugir.
“Matheus não negou, ele levou o Kauê pro Rio de Janeiro. Disse que teve a incumbência de tirar o Kauê da cidade e de dar fuga ao Kauê”, diz Osvaldo Nico, secretário executivo da Segurança Pública de SP.
Segundo Eduardo Cuntis, advogado da família, todos moram no mesmo bairro e se conhecem, mas Matheus e Marcos não estão envolvidos no crime.
Caso Gritzbach: imagens mostram momento da execução do empresário
Reprodução/TV Globo
Em nota, a Secretaria De Segurança Pública de São Paulo disse que durante as prisões de sexta, foram apreendidos também munição e celulares. A investigação segue sob sigilo e informações serão preservadas para garantir a autonomia do trabalho policial.
A secretaria afirmou ainda que os policiais militares que faziam escolta para Vinícius seguem afastados e que as corregedorias da PM e da Polícia Civil acompanham as apurações e que medidas pertinentes serão tomadas.
Um mês depois do crime, policiais que cuidam da investigação dizem já ter indícios sobre quem são os mandantes, mas ainda há pontos a esclarecer sobre a execução de Vinicius Gritzbach num dos lugares mais movimentados do país.
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